D.O.E.: 10/10/2024

RESOLUÇÃO CoIP Nº 8705, DE 09 DE OUTUBRO DE 2024

Dispõe sobre o uso de nome social para pessoas transgênero na Universidade de São Paulo e sobre as ações necessárias para evitar violências e discriminações.

A Pró-Reitora de Inclusão e Pertencimento da Universidade de São Paulo, usando de suas atribuições legais e tendo em vista o deliberado pelo Conselho de Inclusão e Pertencimento, em sessão realizada em 10 de junho de 2024 e pela Comissão de Legislação e Recursos, em sessão realizada em 02 de outubro de 2024, considerando:
– a Constituição da República Federativa do Brasil, em seus artigos 1º, incisos II e III, artigo 3º, inciso IV, artigo 5º e artigo 19, que estabelecem como princípios, direitos e garantias fundamentais: a cidadania, a dignidade da pessoa humana, a promoção do bem de todos, todas sem preconceitos, a igualdade perante a lei e a laicidade do Estado;
– os princípios de proteção dos direitos humanos consagrados em instrumentos internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966), o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), o Protocolo de São Salvador (1988), a Declaração da Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata (2001) e os Princípios de Yogyakarta (2008);
– a Resolução nº 12, de 16 de janeiro de 2015, da Secretaria de Direitos Humanos do Governo Federal, que estabelece parâmetros para a garantia das condições de acesso e permanência de pessoas transgênero e travestis – e todas aquelas que tenham sua identidade de gênero não reconhecida em diferentes espaços sociais – nos sistemas e instituições de ensino, formulando orientações quanto ao reconhecimento institucional da identidade de gênero e sua operacionalização;
– a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB (Lei nº 9.394/96), artigo 3º, que estabelece igualdade de condições para acesso e permanência na escola, liberdade de aprender e pluralismo de ideias, respeito às liberdades individuais de gênero e sexuais, gestão democrática do ensino público, valorização das experiências extraescolares e vinculação entre educação e as práticas sociais;
– as decisões consagrando o princípio da igualdade e da não discriminação prolatadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.277 e na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 132 (união civil homoafetiva) em 2011; no Recurso Extraordinário (RE) nº 670.422 e na ADI nº 4.275 (direito à identidade de gênero das pessoas transgênero e travestis) em 2018; no Mandado de Injunção nº 4.733 e na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) nº 26 (criminalização da LGBTfobia) em 2019; na ADI nº 5.543 (direito à doação de sangue por homens gays, bissexuais, mulheres transgênero e travestis) em 2020; e nas diversas ações em que, recentemente, foi declarada a inconstitucionalidade de legislações municipais e estaduais que proibiam discussões de gênero e sexualidade nas escolas;
– o Decreto Estadual nº 55.588, de 17 de março de 2010, que dispõe sobre o tratamento nominal das pessoas transgênero e travestis nos órgãos públicos do Estado de São Paulo e dá providências correlatas, no seu artigo 1º, pelo qual fica assegurado às pessoas transgênero e travestis o direito à escolha de tratamento nominal nos atos e procedimentos promovidos no âmbito da Administração direta e indireta do Estado de São Paulo:
– que o não reconhecimento da identidade de gênero e do nome social se caracteriza como violência simbólica e adoção do uso do nome social garante o respeito à identidade de gênero de pessoas transgênero no âmbito da USP, evitando constrangimentos, estigmas, preconceitos, violência e a evasão escolar dessas pessoas; e
– por fim, o compromisso da USP em promover o respeito aos direitos humanos, à pluralidade, à dignidade humana, à inclusão e à identidade de todas as pessoas, assim como de evitar qualquer forma de discriminação, violência, ameaças ou constrangimento contra pessoas transgênero e travestis, baixa a seguinte

RESOLUÇÃO:

Artigo 1º – Fica assegurado às/aos docentes, servidoras/es e discentes da USP, cujo nome de registro civil não reflita a sua identidade de gênero, o direito de uso e de inclusão do seu nome social nos registros, documentos e atos da vida funcional e acadêmica.

§1º – Por nome social, entendemos o prenome pelo qual pessoas trans ou transgênero se identificam, são reconhecidas e identificadas em suas relações sociais, na medida em que o seu nome de registro civil não reflete sua identidade de gênero e, por isso, pode imputar-lhe potenciais constrangimentos e agressões.
§2º – Para fins desta Resolução, além das pessoas qualificadas no caput deste artigo, seus efeitos estendem-se também aos demais interessados que vierem a possuir ou que possuam vínculo temporário com a USP, tais como: pós-doutorandas/os, docentes contratadas/os por prazo determinado, visitantes, estagiárias/os e, ainda, colaboradoras/es que vierem prestar ou que prestem serviços de natureza voluntária junto à Instituição.
§3º – O direito assegurado por força desta Resolução estende-se também àquelas/es interessadas/os que vierem a participar de eventos, tais como: congressos, fóruns, simpósios, cursos de extensão a serem ofertados pela USP.
§4º – Tal inclusão se dará por meio da substituição do prenome constante no registro civil pelo nome social, acrescido do sobrenome civil.

Artigo 2º – Fica assegurado a discentes adolescentes (de 12 a 18 anos incompletos) o direito ao uso do nome social, a ser exercido por meio de seus representantes legais, em conformidade com o disposto no artigo 1.690 do Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Artigo 3º – Caso docente ou servidor/a, o/a interessado/a deverá manifestar sua opção pela inclusão ou exclusão do nome social, mediante requerimento dirigido à área de pessoal de sua Unidade/Órgão de lotação, salvo no caso de docente ou servidor/a ingressante, que deverá dirigir seu requerimento ao Departamento de Recursos Humanos.

§1º – O requerimento poderá ser formalizado no ato da posse, ou a qualquer momento após seu ingresso na USP.
§2º – A qualquer momento de sua vida funcional, ou após seu desligamento da USP, poderá a/o interessada/o requerer a exclusão do nome social, tal como utilizado em decorrência do requerimento previsto no presente dispositivo, retornando às idênticas anotações correspondente ao registro anteriormente lançado.

Artigo 4º – Caso discente, a/o interessada/o deverá manifestar sua opção pela inclusão ou exclusão do nome social, mediante requerimento dirigido à Diretoria Acadêmica.

§1º – O requerimento poderá ser formalizado na Ficha de Matrícula ou a qualquer momento após seu ingresso na USP.
§2º – A qualquer momento de sua vida acadêmica, ou após seu desligamento da USP, poderá a/o interessada/o requerer a exclusão do nome social, tal como utilizado em decorrência do requerimento previsto no presente dispositivo, retornando às idênticas anotações correspondente ao registro anteriormente lançado.

Artigo 5º – O nome social será o único exibido nos seguintes casos:

I – cadastro de dados e informações de uso social;
II – comunicações internas de uso social;
III – endereço de correio eletrônico;
IV – diretório de ramais da USP;
V – nome de usuário em sistemas de informática;
VI – em documentos internos de natureza administrativo-acadêmica, tais como:
a. diários de classe;
b. cadastros;
c. fichas;
d. formulários;
e. carteiras;
f. divulgação de notas ou de processos seletivos;
g. chamadas orais nominais para verificação de frequência às atividades acadêmicas;
h. Em solenidades como entrega de certificados, colação de grau, premiações e eventos similares.
VII – Versões finais de teses, dissertação e os trabalhos de conclusão de curso, que serão tornados públicos pela USP apenas com o nome social, tendo em vista o respeito à privacidade e a auto identificação da pessoa requerente substituindo o nome de registro civil.

Artigo 6º – O nome civil poderá acompanhar sempre em menor destaque o nome social nos seguintes casos:

I – documento de identificação funcional ou outro de uso interno da USP e suas Unidades e órgãos, com a identificação do nome civil no verso do documento;
II – diplomas emitidos pela USP, com a identificação do nome civil no verso do documento;
III – históricos escolares, certidões e atestados, com a identificação do nome civil ao final do documento, como observação.

Artigo 7º – Após o requerimento da/o interessada/o, conforme os artigos 3º e 4º, os procedimentos administrativos deverão ser realizados no prazo de até 15 (quinze) dias, visando à adoção do nome social nos casos exemplificados nesses artigos.

Parágrafo único – Na hipótese do requerimento ter sido formulado pela/o interessada/o no momento de seu ingresso na USP, será o nome social imediatamente adotado em todos os registros da USP, para uso nas situações descritas nos artigos 3º, 4º e 5º.

Artigo 8º – É garantido que a pessoa seja referida e chamada, na USP, sempre pelo seu nome social e pelo gênero pelo qual se identifica. As/Os servidoras/es técnicas/os e administrativas/os, o corpo docente e o corpo discente que violarem os direitos regulados por essa Resolução serão responsabilizadas/os administrativamente, na forma dos diplomas legais cabíveis.

Artigo 9º – Caso haja flexão por gênero na identificação ou tratamento, deverá ser utilizada a flexão de gênero que corresponda à identidade de gênero da/o servidoras/es, discentes e demais usuárias/os.

Artigo 10 – Os formulários deverão respeitar as seguintes diretrizes:

I – em formulários de cadastro, deve-se conter o campo de preenchimento “nome social”, além do campo de “nome de registro civil”. A identificação da pessoa deve ser pelo nome social caso esse campo seja preenchido. O nome de registro civil deve ficar protegido e não ser exposto publicamente;
II – em formulários de preenchimento, deve-se optar pelo campo “gênero” em vez de “sexo” sempre que possível. Nas opções de preenchimento deve conter: “mulher cis”, “mulher trans”, “homem cis”, “homem trans”, “travesti”, “não binarie”, “outro”. Quando inevitável o uso da categoria “sexo”, ou seja, quando se mostra importante identificar/informar a dimensão anatômica e fisiológica da pessoa, incluir o descritor “intersexo”;
III – em formulários de preenchimento, deve-se preferencialmente utilizar o termo “filiação” em vez de “mãe” e “pai”.

Artigo 11 – A Universidade promoverá medidas de modo a garantir o direito à identidade de gênero, bem como assegurar a proteção contra a sua violação.

Artigo 12 – Casos omissos na presente Resolução serão resolvidos pela Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento.

Artigo 13 – Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. (Proc. 2024.1.3099.1.1)

DISPOSIÇÃO TRANSITÓRIA

Artigo único – As instâncias competentes da Universidade terão o prazo de 180 dias para adequação de seus procedimentos internos, a fim de dar pleno cumprimento às disposições desta Resolução.

Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento da Universidade de São Paulo, 09 de outubro de 2024.

ANA LÚCIA DUARTE LANNA
Pró-Reitora de Inclusão e Pertencimento

MARINA GALLOTTINI
Secretária Geral